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Fibras na Nutrição Humana - Aplicações clínicas

Constipação:

A passagem ordenada do conteúdo intestinal gera uma equilibrada absorção de água e sal. Quando o trânsito intestinal apresenta-se lento, ocorre excessiva absorção de água e o conteúdo intestinal torna-se menos úmido e as fezes ficam duras, resultando na obstipação ( 97 ).

Apesar da grande variedade individual sobre o que se pode considerar obstipação, defini-se como um distúrbio caracterizado pela diminuição da frequência das evacuações a intervalos maiores que 48 ou 72 horas, o que permite um aumento da absorção de água pela mucosa intestinal, resultando em fezes duras e de difícil passagem pelo reto ( 98,99,100 ).

A obstipação é um sintoma e uma queixa gastrointestinal freqüente. Pode representar a manifestação de vários distúrbios. A etiologia pode ser um distúrbio metabólico, orgânico, um efeito na enervação extrínseca do cólon ou estar relacionada ao uso de medicamentos ( 101 ).

A forma mais freqüente de obstipação crônica está associada ao trânsito intestinal lento, em que a alimentação inadequada, o baixo consumo de fibras, diminuição ou perda do reflexo evacuatório e vida sedentária exercem papel fundamental.

Marlett y cols, 2000, estudou a função intestinal de indivíduos que receberam fibras provenientes de um isolado de psyllium e demonstrou que eles apresentaram fezes mais macias, além de facilidade na evacuação, sensação de alívio e aumento do volume fecal. Além de macias, a maioria das fezes coletadas eram visivelmente mais gelatinosas ( 102 ). Estudos sobre a estrutura dos polissacarídeos contidos na casca da Plantago ovata , sugerem que os polímeros têm relativamente menor peso molecular e são altamente ramificados, dificultando o acesso enzimático bacteriano ( 103 ).

Outro estudo compara a fibra de aveia e a fibra de trigo, observando que em ambos os grupos, houve aumento do volume fecal.

A fibra de trigo aumentou a concentração fecal de açucares e de massa mais que a fibra da aveia, enquanto esta aumentou a massa bacteriana fecal e a concentração de gordura nas fezes ( 16 ).

O consumo adequado de fibras previne a obstipação e enfermidades associadas.

Obesidade:

A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera a obesidade o problema número um de saúde pública mundial, causando grande preocupação entre os profissionais médicos, nutricionistas e pesquisadores da área. Dados recentes mostram que no Brasil a doença atinge cerca de 20% da população adulta, entre homens e mulheres, ou seja, mais de 30 milhões de pessoas ( 104,105 ) . As mudanças nos hábitos alimentares e o aumento da inatividade física e do sedentarismo são considerados fatores cruciais para explicar o avanço deste problema ( 106 ).

O sobrepeso e a obesidade são considerados fatores de risco à saúde, uma vez que possuem forte relação com a incidência de doenças (cardiovasculares, diabetes, cálculos biliares, disfunção respiratória e algumas formas de câncer) ( 10,108,109 ) .

Muitos estudos mostram que dietas ricas em fibras podem prevenir ou auxiliar no tratamento da obesidade ( 110,111 ). De acordo com Howarth et al ( 112 ) a maioria dos estudos publicados indicam que um aumento no consumo de fibras solúveis e insolúveis proporciona saciedade e diminui conseqüentemente a fome. De acordo com o pesquisador, 14 g de fibra/dia por mais de 2 dias está associado com uma diminuição de 10% no consumo de energia e com uma perda de peso de 1,9 Kg após 3,8 meses.

Em estudo recente, Birketvedt et al ( 113 ) mostrou o potencial de um suplemento rico em fibras na redução de peso de mulheres com IMC acima de 27,5 Kg/m 2 que reduziram o peso significativamente, com uma perda de 8Kg após 24 semanas de estudo. Rigaud ( 114 ) avaliou a influência da fibra sobre a perda de peso em indivíduos com IMC de 29,3 Kg/m 2 e ao final do estudo, os pacientes perderam em média 5,5 Kg.

Rigaud observou também a ação do psyllium no retardo do esvaziamento gástrico após refeição hipocalórica e sobre a sensação de fome, verificando redução na concentração de insulina e glicose pós-prandial.

Frati-Munari ( 115 ) demonstrou a utilização de Plantago ovata em indivíduos obesos, verificando perda significativa de peso. Segundo este estudo, apresentaram aumento da saciedade e menor ingestão calórica.

Estudos avaliaram o efeito da suplementação com fibra solúvel e insolúvel, durante 4 meses em indivíduos saudáveis, mostrando de forma significativa a diminuição na sensação de fome e aumento na saciedade ( 114 ).

A conclusão na maioria destes trabalhos é que as fibras alimentares aftam o processo de digestão desde seu início na boca. Alimentos ricos em fibras requerem maior tempo de mastigação, o que estimula a saliva e diminui a velocidade de ingestão de alimentos; o que proporciona uma redução no consumo calórico. Já a mastigação exerce efeito direto sobre o hipotálamo, produzindo a sensação de saciedade ( 116 ) . Outro ponto importante, é que as fibras também podem interferir na absorção de nutrientes, reduzindo a absorção de glicose e lipídeos e consequentemente, diminuindo colesterol plasmático e gordura corporal ( 117,118,119 ).

Hipercolesterolemia:

Englyst et al ( 120 ) relataram que o AR (amido resistente) quando acrescido à dieta, reduz a concentração de colesterol sérico com também aumentava, como também aumenta a excreção biliar, tendo um efeito comparável ao da fibra solúvel na dieta. De Deckere et al ( 121 ) investigaram o efeito hipocolesterolêmico do AR, explicando-o pelo aumento da excreção fecal dos ácidos biliares e esteróis neutros. Seus trabalhos confirmaram que a ingesta aumentada eleva o “pool” de ácidos biliares no fígado, contribuindo dessa forma para a redução da concentração do colesterol sérico.

Diabetes:

O Diabetes mellitus é um distúrbio crônico caracterizado por comprometimento do metabolismo da glicose e de outras substâncias produtoras de energia, bem como pelo desenvolvimento tardio de complicações vasculares e neuropáticas ( 97 ), gerando disfunção, danos ou falência de múltiplos órgãos, especialmente coração, rins, olhos, nervos e vasos sanguíneos ( 122,123 ).

A principal característica do Diabetes é o aumento da glicemia, decorrente da falta ou diminuição de insulina circulante, ou mesmo da resistência dos tecidos periféricos em utilizar a insulina disponível.

Portadores de Diabetes são freqüentemente acometidos por doenças cardiovasculares e vários fatores de risco estão associados a doença. Essas duas patologias podem estar interrelacionadas em 40 a 60% dos casos ( 124,125,126 ).

Diversos estudos demonstram que dietas ricas em carboidratos e fibras melhoram significativamente o controle da glicemia e reduzem o colesterol total em pacientes diabéticos, não aumentando os níveis de insulina e triglicérides plasmáticos ( 127,128,129,130 ).

As evidências atuais sugerem que dietas com alto teor de fibras, especialmente fibras solúveis, interferem positivamente na melhora do metabolismo de lipídeos e glicídeos, possibilitando sua aplicação clínica no tratamento do diabetes mellitus. Os suplementos nutricionais enriquecidos com fibras, rotineiramente prescritos aos diabéticos, podem configurar um importante coadjuvante à terapia farmacológica ( 131,132 ) e ter uma maior aceitação terapêutica ( 133,134,135 ).

As justificativas sócio-culturais para a associação de dietoterapia ao aporte de fibras em produtos comerciais são: certeza da dose consumida, facilidade de manipulação e administração, relação custo/benefício e aceitação cultural ( 107,136,137,138 ).

As fibras solúveis podem favorecer o diabético, uma vez que, diminuem o tempo de esvaziamento gástrico e de trânsito intestinal, retardam a absorção de glicose, com consequente queda da glicemia pós-prandial.

A maioria dos estudos clínicos investigou o efeito hipolipemiante de 4 fibras solúveis: fibra da aveia, psylium, guar e pectina ( 139 ).

A composição nutricional da aveia compreende três grupos de carboidratos. O primeiro grupo é de fácil digestão. O segundo grupo forma o principal componente do mingau de aveia, a mucilagem de aveia; e a terceira fração é constituída por carboidratos semelhantes à frutose que não precisam de insulina para sua decomposição e que são importantes na alimentação dos diabéticos ( 140 ).

A adição de b -glucana, presente em grande quantidade no farelo de aveia, tem demonstrado, reduzir o índice glicêmico (IG) dos alimentos ingeridos e a absorção de colesterol ( 141 ). Recomenda-se que os alimentos com baixo IG substituam, sempre que possível, os com alto IG, porque podem ser úteis no controle da glicemia e dos níveis de lipídeos plasmáticos, independentemente do seu conteúdos em fibras ( 142 ).

Embora os alimentos com alto teor de fibras tenham, frequentemente baixo índice glicêmico, o conteúdo de fibras não é o único fator que contribui para o retardo da digestão dos carboidratos. Desse modo, existe discrepância entre o conteúdo de fibras e o IG de alguns alimentos, que não são particularmente ricos em fibras, mas possuem baixo índice glicêmico ( 143,144 ) como: aveia, trigo integral, arroz parboilizado e integral, feijões, maça, laranja, leite, etc. No tratamento dietoterápico do diabético, tem-se como prática a utilização de alimentos com baixo IG, com o objetivo do retardo no aparecimento de complicações como as microangiopatias ( 145 ).

A eficiência no controle glicêmico com o aumento do consumo de fibras solúveis é demonstrada em diversos estudos.

A goma guar, a pectina, a b -glucana da aveia e o psyllium podem melhorar a tolerância à glicose ao baixar os níveis pós-prandiais da glicose e insulina do sangue e doses de 3-15g/dia dessas fibras solúveis mostram redução de 5-15% do colesterol plasmático ( 18,23,29 ).

Mais de 12 trabalhos publicados reportam que a aveia, tem a capacidade de reduzir a glicemia de jejum, pós-prandial e os níveis de insulina ( 146 ).

Estudos realizados com suplementos contendo Psyllium husk demonstraram benefício no controle glicêmico ( 35,36,37 ). Cem gramas de psyllium fornecem 71g de fibras solúveis e o FDA reconhece hoje seu papel na redução do colesterol sangüíneo. A combinação de dieta pobre em gorduras saturadas e colesterol mais psyllium , pode reduzir os níveis de colesterol total em 4% e LDL colesterol em 7%. A fibra solúvel do psyllium reduz a absorção sangüínea de colesterol e ácidos biliares do intestino levando à redução dos níveis sangüíneos de colesterol.

Câncer de cólon:

Dados do Ministério da Saúde apontam que o câncer de cólon é a terceira neoplasia mais letal em homens e a quarta em mulheres no Brasil, podendo ocupar o quarto ou quinto lugar no mundo.

A carcinogênese de câncer de cólon ainda não está totalmente elucidada e certamente abrange diversificados fatores de risco associados, como obesidade e sedentarismo e externos, como meio ambiente, fumo, exposição à radioterapia e hábitos dietéticos ( 147 ). A ingestão em excesso de gorduras tem sido associada ao câncer de cólons ( 148 ).

Embora a terapêutica desta doença inclua avanços no tratamento, a sobrevida dos pacientes com câncer colorretal sofreu apenas discreta melhora nas últimas duas décadas ( 149 ).

As ações e efeitos anticarcinogênicas das fibras são diversos, incluindo ligação com ácidos biliares ( 150 ), produção de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC) e diminuição da produção de insulina.

Os AGCC podem proteger o cólon contra a carcinogênese por ação direta ou por redução do pH intestinal e impedir a conversão de ácidos biliares primários em secundários de ação carcinogênica ( 151 ). Existem evidências experimentais que apontam que os AGCC, em particular o butirato, promovem fenótipo normal no colonócito e possuem ação antineoplásica ( 152,153 ).

As fibras solúveis têm a capacidade de retardar a absorção de carboidratos, reduzindo, assim, a carga glicêmica e a hiperinsulinemia pós-prandial conseqüente, que está ligada a carcinogênese colônica ( 154 ).

Estudos do tipo caso-controle concluíram que a ingestão de alimentos ricos em fibras está inversamente relacionada ao risco de câncer de cólon ( 155 ). No Hawai, um estudo evidenciou o risco reduzido de câncer colorretal em associação à maior ingestão de fibra alimentar ( 156 ). Num estudo feito em região mediterrânea, a ingestão de grãos refinados manifestou-se associada a aumento do risco de câncer gástrico, colorretal, de mama, aparelho digestivo alto e tireóide ( 157 ).

O maior estudo de corte ainda não finalizado e que está em andamento é o EPIC (European Prospective Investigation of Câncer and Nutrition), que envolve nove países europeus e tem mais de 400.000 pessoas, mostram que a ingestão elevada de fibras (32,5 g) associou-se com redução de 40% o câncer de cólon ( 158,159 ).

Alguns estudos apontam também que as fibras podem não ser eficientes em reduzir a recidiva de adenomas colorretais ( 160,161,162 ).

A maior parte dos estudos mostram efeito positivo das fibras em relação à câncer, no entanto, poucos foram os estudos longitudinais que encontraram efeito protetor das fibras neste contexto. Porém, para os profissionais da saúde é possível apreciar seu efeito protetor, especialmente da celulose e farelo de trigo sobre a carcinogênese.

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