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Riscos nutricionais na terceira idade

Nutricionista Anita Sachs

 

O envelhecimento é um processo gradual que vem acontecendo há algumas décadas. A maioria das teorias do envelhecimento se relacionam à incapacidade de replicação do DNA e perda da viabilidade da célula e, portanto, dos diversos órgãos do organismo. As teorias mais comuns do envelhecimento relacionam-se a uma ou mais das seguintes definições: perda da capacidade imunológica, proliferação celular, taxa metabólica basal, taxa de reparo do DNA, dano por causa dos radicais livres e/ou taxa de síntese e catabolismo de proteínas.

Os estudos animais têm mostrado forte evidência que a dieta tem um papel fundamental no processo de envelhecimento. O achado mais consistente de estudos com roedores é que uma restrição alimentar moderada, marcadamente diminui a expectativa de vida , comparado com animais alimentados “ad libitum”. A restrição alimentar também diminui a incidência de muitas doenças crônicas como glomerulonefrites, aterosclerose e tumores. Estudos com restrição dietética, a partir da retirada seletiva de macronutrientes individualmente (gordura, carboidrato ou proteína), também já foram conduzidos em animais. No entanto, sem que ocorra uma concomitante restrição da ingestão de energia, um pequeno aumento na expectativa de vida foi encontrado. O excesso de consumo de proteína ou gordura, no entanto, aumenta a incidência de tumores e algumas doenças em certos órgãos e, diminuem o tempo de aparecimento de índices graves de maturação precoce tanto física, como bioquímica e imunológica até do envelhecimento como um todo. A gravidade, idade de início e duração da alteração dietética são importantes na determinação da resposta eventual à restrição alimentar. Alguns micronutrientes também têm efeito na expectativa de vida e modulam os mecanismos do envelhecimento, pelo menos em algum grau. Por exemplo, o aumento no consumo de substâncias antioxidantes (ácido ascórbico, alfa-tocoferol, carotenóides) podem, parcialmente, diminuir as concentrações de radicais livres.

Os idosos constituem a mais diversa população quando comparada à outras faixas etárias. Os indivíduos idosos têm capacidades totalmente variáveis além de diferentes níveis de funcionamento. Como um todo, a população idosa tem mais chance do que a população de adultos jovens de ter um estado nutricional marginal e, portanto, apresentar um maior risco de deficiência nutricional em momentos de estresse ou de cuidados da saúde. Os problemas emocionais, físicos, sociais podem interferir com o apetite ou afetar a habilidade de adquirir, preparar e consumir dietas nutricionalmente adequadas. Estes fatores incluem o fato de a pessoa viver ou não sozinha, quantas refeições diárias são realizadas, quem prepara a alimentação e compra os alimentos, e qualquer impedimento físico que altere estes processos; problemas de dentição e mastigação, renda adequada para adquirir apropriadamente os alimentos e uso de álcool e medicamentos. Para completar este quadro adverso, tem-se que uma queda no funcionamento dos órgãos normalmente acompanha o processo de envelhecimento ,especialmente nos mais velhos (aqueles com mais de 80 anos). Espera-se que, muitas destas mudanças na função normal possam influenciar a necessidade nutricional do indivíduo idoso.

Estado nutricional:

Existe evidência que a relação entre peso e mortalidade difere nos diferentes estágios de vida. O estudo de Whitehall, com 18.000 servidores ingleses, mostrou que a relação entre o quintil de peso e mortalidade muda com a idade; para os homens mais jovens a mortalidade por doença cardiovascular (DCV) aumenta linearmente do menor para o maior quintil enquanto que nenhuma relação é evidente para os homens mais velhos. Outros estudos investigaram a relação de peso e mortalidade no idoso. Todos parecem concordar com um efeito protetor de um aumento moderado de peso com o envelhecimento.

Saúde oral:

O processo de envelhecimento envolve uma série de mudanças que podem afetar e serem afetadas pela condição oral. Problemas dentários são considerados um contribuidor primário à desnutrição do idoso. A falta de dentes torna difícel a ingestão de uma dieta normal. Quando um indivíduo tem falta de dentes ou, tem próteses mal ajustadas, a qualidade da dieta é ruim sendo que, a consistência mole dos alimentos, pode causar constipação. Com o envelhecimento, como já foi mencionado, a sensação de cheiro declina, frequentemente levando ao aumento no uso de alimentos cariogênicos. Em, aproximadamente, 68% daqueles com 65 a 69 anos e, 51% dos com mais de 80 anos, parcialmente sem dentes, a cárie dental representa um problema.

Os fatores dietéticos, além do avançar da idade, são importantes no início e progressão de cáries dentais, principalmente as de raiz. Quando o tecido gengival retrai, como ocorre no idoso, as superfícies das raízes dos dentes estão expostas ao ambiente oral. Também, a xerostomia, comum pelo excessivo uso de medicamentos, normalmente resulta em cárie de raiz. Aproximadamente 50% daqueles com 75 anos ou mais tomam dois ou mais medicamentos por dia, e um terço da metade de idosos com idade mais avançada podem apresentar xerostomia. Pelo fato das raízes não terem a camada protetora, elas estão altamente susceptíveis às cáries. As lesões de cáries de raízes são primariamente uma doença de pessoas idosas. No estudo NHANES III, as lesões de superfície de raízes foram encontradas em 54% dos homens e 41% das mulheres entre 65 e 74 anos de idade. O número médio de superfícies cariadas para aqueles entre 65 e 74 anos foi de 2,2. Os idosos mais propensos a desenvolverem caries de raízes são aqueles com cárie de coroa, retração gengival, baixo fluxo salivar, baixa exposição ao flúor e ingestão frequente de carboidratos fermentáveis. Em um estudo de corte de idosos saudáveis não-intitucionalizados, uma alta ingestão diária de dietas semi-sólidas e de alimentos lentos de serem dissolvidos como sorvetes, gelatina, balas e antiácidos foi positivamente correlacionado com cáries. Em um estudo longitudinal de dois anos, de idosos da região de Boston, nos EUA, os indivíduos no quintil mais alto para cáries tinham, significantemente, um maior consumo de líquidos adocicados, carboidratos sólidos fermentáveis e amido, do que idosos livres de caries. A consulta nutricional, a higiêne bucal adequada e a terapia de flúor devem do cuidado de idosos com retração gengival.

A doença periodontal é também um problema para os idosos com, aproximadamente, um terço mostrando evidência de doença periodontal grave o que pode, indiretamente levar à desnutrição por ingestão insuficiente de alimentos. O câncer oral é também bastante comum com o envelhecimento, quase que triplicando entre 55 e 64 anos de idade e naqueles com mais de 85 anos. Isto eleva o metabolismo, causando um aumento nas necessidades nutricionais. A perda de dente, dor, e próteses mal ajustadas, além de outros, podem prejudicar a mastigação. Além disto, as condições sociais que permeiam a alimentação e, portanto a nutrição, podem piorar pela perda ou mobilidade dos dentes e a condição e/ou retenção da prótese dentária.

Considerando que os idosos estão em risco nutricional particular e problemas orais, todos os profissionais da saúde devem ter a preocupação de prevenção, em suas atividades.

Órgãos do sentido:

Estatisticamente, significante declínio no sabor e, especialmente, no odor têm sido registrados em muitos, mas não em todos, estudos com idosos. No entanto, a significância funcional destas mudanças é obscura pois a magnitude absoluta do declínio é pequena. Os idosos apresentam recuperação menor após adaptação a um estímulo, olfato retronasal ( um grande componente do sabor dos alimentos) diminuído e habilidade comprometida de discriminar estímulos em alimentos complexos. O uso aumentado de medicamentos e a maior prevalência de doenças que podem influenciar a função sensorial podem também contribuir para a premissa de que o envelhecimento está associado com a diminuição da função quimiosensorial. Finalmente, a perda de memória, cognição e habilidades em testes, que ocorrem com o envelhecimento, podem resultar em perfís inadequados. O declínio no número de papilas gustativas com o envelhecimento é pequeno e o número de papilas gustativas não é fortemente correlacionado com a função de sabor, uma vez que apenas um pequeno número de papilas podem prover toda a gama da experiência sensorial. Além disto, as estruturas de recepção em uma área da cavidade oral compensa as perdas de sensação em outras áreas. Todas as mudanças que ocorrem com estas atividades sensorias, afetam a ingestão de alimentos, podendo levar à desnutrição. 

Aumento dos níveis de colesterol com o envelhecimento:

Declínio da atividade do receptor de LDL- colesterol:

Nos Estados Unidos, os níveis séricos de colesterol aumentam de 40 a 50 mg/dL entre os 20 e 50 anos. Por volta da metade deste aumento, aparentemente, resulta de um aumento do peso corporal, mas uma outra proporção parece estar relacionada ao envelhecimento “per se”. O processo de envelhecimento é acompanhado por um declínio no CLEARENCE de LDL da circulação; provavelmente os mecanismos complexos que regulam a função dos receptores de LDL se tornam menos eficientes com o envelhecimento. Por exemplo, a liberação hepática de colesterol pode estar um pouco retardado com o evelhecimento levando a um aumento no conteúdo hepático de colesterol. Alternativamente, mecanismos sintéticos para os receptores de LDL podem se tornar SLUGGISH, causando diminuição da expressão de receptor e catabolismo do LDL. Existe, no entanto, uma curiosa observação: os níveis séricos de colesterol não aumentam progressivamente do adulto jovem para o idoso. A maior parte do aumento ocorre entre os 20 e 50 anos. Após isto, os nívies de LDL-colesterol atingem um platô, ou mesmo, declinam um pouco. Isto sugere que fatores externos controláveis, como o ganho de peso, que normalmente ocorre até uma certa fase da terceira idade, atuam, de forma crítica, no aumento dos níveis de colesterol, relacionados à idade.

Obesidade e aumento do colesterol com o envelhecimento:

Existe uma forte correlação entre mudanças nas concentrações séricas de colesterol do adulto jovem ao idoso. A maior parte do ganho de peso ocorre entre a idade de 20 e 50 anos. Durante este mesmo período, existe um aumento das concentrações de colesterol sérico.. Apesar de estudos epidemiológicos terem indicado que os níveis de colesterol aumentam com a idade, mesmo nas pessoas que apresentam pequeno ganho de peso, aqueles que ganham mais peso, manifestam maiores incrementos no colesterol sérico. O aumento do colesterol com o envelhecimento ocorre tanto nas frações VLDL como no LDL. Esta mudança combinada sugere um efeito da obesidade no colesterol sérico.

Diabetes Mellitus:

Também, o diabetes mellitus constitui-se num problema crônico que tem crescido na população idosa. A prevalência de diabetes está acima de 10% na população americana com mais de 60 anos e, aproximadamente, 20% naqueles com mais de 80 anos. Os diabéticos com mais de 65 anos têm um risco relativo de mortalidade de, aproximadamente, 1,5 vezes do que aquela dos indivíduos não-diabéticos. Os fatores que contribuem para a resistência diminuída à glicose e desenvolvimento de diabetes incluem, diminuição da atividade fisica, diminuição do consumo de carboidratos complexos e uma maior proporção de gorduras na dieta, e aumento da adiposidade com diminuição da massa magra.. Outras doenças, além de medicamentos podem contribuir para o desenvolvimento de diabetes no idoso.

Pelo fato de os idosos terem múltiplos déficits de funcionamento, incluindo defeito na secreção de insulina, diminuição da ação da insulina para impedir a liberação hepática de glicose, e resistência periférica de insulina, o tratamento deve, em primeiro lugar, ser voltado para aumentar-se a sensibilidade à insulina a partir da alimentação e atividade física. A ingestão de uma alimentação que forneça energia a partir de uma variedade de alimentos é extremamente importante. O uso de agentes orais e/ou insulina pode, normalmente, ser ajustado, para permitir que os idosos sigam planos dietéticos que estejam de acordo com as suas preferências alimentares e circunstâncias de vida.. Algumas habilidades do educador em diabetes e, o envolvimento do paciente, são requisitos para se garantir o aprendizado do idoso diabético. Os profissionais da saúde necessitam ter atitudes positivas, para garantir que os idosos mudem o seu enraizado estilo de vida em relação aos hábitos alimentares e de atividade física.

Medicamentos:

A idade avançada é influenciada pelo uso de medicamentos. Os pacientes idosos, que estão sob o cuidado de diversos especialistas, e que podem se auto-medicar por diferentes sintomas, estão sob maior risco de efeitos adversos de interação nutriente-droga e interações com a alimentação. Portanto, o profissional de saúde, para estimar o risco destas interações, deve considerar as condições do idoso, as suas consequências metabólicas e os medicamentos administrados para as diversas situações. Também, deve estar atento, além da dieta prescrita, aos hábitos alimentares do paciente e a possibilidade do uso de álcool.

A complexidade das influências impostas, tanto pelas condições médicas, como pelo envelhecimento, no risco de interações droga-nutriente, é exemplificado pelo risco de anemia grave por deficiência de ferro em idosos diabéticos com neuropatia autonômica do cólon. Se este paciente ainda tiver osteoartrite, quase que com certeza, fará uso de droga não-esteróide antinflamatória. Este paciente apresenta risco de ulceração colônica, ou mesmo sangramento induzido pela droga o que, por sua vez, pode levar à anemia. O risco de anemia ainda é maior se o paciente usar anticoagulante (por exemplo, para previnir trombose) ou álcool em excesso.

Os pacientes recebendo alimentação enteral têm risco adicional, pois os medicamentos que normalmente são oferecidos por via oral podem ser adicionados à fórmula nutricional. Estes pacientes podem desenvolver problemas por incompatibilidades físicas entre o medicamento e a fórmula enteral, incompatibilidades farmacêuticas resultante da forma na qual o medicamento deverá ser administrada e constipação (ou mais comumente, diarréia) que pode ser erroneamente atribuída à dieta enteral propriamente dita.

Álcool:

Quanto ao consumo de álcool, quando este é consumido em grandes quantidades e, cronicamente o estado nutricional como um todo é afetado, incluindo redução do apetite e prejuízo na absorção, metabolismo e excreção de nutrientes. O etanol também está associado com sérios problemas médicos e sociais como cirrose hepática, adenocarcinoma do trato gastrointestinal (particularmente boca, faringe, laringe e esôfago) e fígado. Em uma pesquisa feita com 554 indivíduos não-alcólatras, que participaram de um estudo de avaliação do estado nutricional do idoso na área de Boston (Estados Unidos da América), a ingestão de álcool foi classificada em três categorias: menos do que 5g/dia, 5 a 14g/dia ou mais do que 15g/dia. A quantidade de álcool consumida foi relacionada com parâmetros nutricionais, bioquímicos e físicos dos indivíduos. As concentrações de retinol plasmático, ferritina e lipoproteína de alta densidade colesterol (HDL-c) foram significativamente maiores; e, cobre sérico, zinco e potássio foram significativamente inferiores naqueles consumindo mais do que 15g/dia do que aqueles com menos do que 5g/dia. Os efeitos estatísticos significantes foram pequenos, no entanto e, portanto, de questionável significado biológico. O álcool apenas afetou os níveis de potássio e de cobre nos idosos usando diuréticos.

Vitaminas:

A ingestão baixa e inadequada de vitaminas pode contribuir para o baixo estado vitamínico observado no idoso. Associado a isto, as mudanças fisiológicas, próprias do envelhecimento, podem aumentar ou diminuir a absorção de vitaminas, influenciando as necessidades nutricionais destes nutrientes.

Vitamina D:

Os idosos têm capacidade reduzida de produzir vitamina D na pele sendo que, no entanto, a absorção não está diminuida. Pelo fato de muitos idosos não tomarem leite por causa de deficiência de lactase ou por acreditarem que, como não são crianças, não necessitam mais deste alimento, a sua única fonte de vitamina D é por compostos multivitamínicos com esta vitamina ou pela exposição aos raios solares. Caso eles não estejam expostos ao sol, podem desenvolver deficiência de vitamina D, que pode resultar num hiperparatireoidismo secundário. Esta condição acelera a osteoporose, podendo causar defeitos de mineralização óssea, resultando em ostomalácea. O resultado desta condição é a fraqueza óssea que pode resultar em risco de fraturas. Muitos estudos em idosos indicam que a deficiência de vitamina D coloca os idosos em risco de desenvolverem fratura de quadril.

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