Dr. Celso Cukier
Como forma didática educacional elencamos algumas perguntas básicas que servirão para orientar um estudo mais aprofundado acerca da inserção entre nutrição e tratamento de fistulas do TGI.
Que fatores devem ser avaliados em relação à fístulas que podem interferir diretamente na conduta nutricional?
As secreções digestivas eliminadas pela fístula podem promover perda de água, eletrólitos, proteínas e outras substâncias orgânicas. Quanto maior o volume, maior esta perda e suas conseqüências. Caso não sejam corrigidas as alterações precocemente a desnutrição surgir, piorando a evolução clínica do paciente. O débito da fístula deve ser avaliado rigorosamente e relaciona-se diretamente com a taxa de morbidade e mortalidade, sendo abaixo de 500 ml de 20%, de 500 a 2000 ml de 40% e acima de 2000 ml de 50% (Maillet e col., 1977).
Outro parâmetro que deve ser observado é a composição das secreções eliminadas pela fístula. Ocorre variação dependendo do local de produção da secreção e sua exteriorização. O quadro abaixo relaciona o local da fístula e suas diferentes composições (Tremolieres, J – Traitment médical des fistules digestives externes. J. Chir. 5:473, 1965).
Fístula |
N total (g/L) |
N em solução (g/L) |
Lipídios (g/L) |
Na (mEq/L) |
K (mEq/L) |
Atividade proteolítica (Unidades) |
Duodenal |
2,2 (0,4-2,7) |
1,2 (0,4-2,7) |
— |
132 (104-173) |
10 (4-46) |
5,5 |
Ileal |
4,4 (0,4-35,3) |
2,2 (1,3-2,6) |
17 |
127 (33-260) |
11,5 (4,5-72) |
5,8 |
Colônica |
7,3 (5,1-10,9) |
2,8 (1,8-3,4) |
14 |
125 (80-142) |
34 (22-56) |
7,1 |
A terapia nutricional pode facilitar o fechamento de fístulas?
A terapia nutricional certamente influencia positivamente a taxa de fechamento espontâneo das fístulas. O fechamento espontâneo das fístulas ocorre geralmente entre quatro e cinco semanas a partir do início da terapia nutricional. É de suma importância que se controle os estados de infecção e sepse para que o balanço nitrogenado seja favorecido e atente-se para o equilíbrio hidro-eletrolítico e ácido-base.
Quando se indica a nutrição enteral em fístulas digestivas?
A nutrição enteral deve ser escolhida sempre que possível por sua importância na manutenção do trofismo intestinal. Está indicada em casos selecionados, com o tubo gastrointestinal funcionante e o débito não estiver muito elevado. Seus efeitos, quando bem utilizada, são semelhantes aos da nutrição parenteral total, em relação às taxas de mortalidade. Observação rigorosa deve ser estabelecida em função do débito da fístula que pode aumentar com o início da nutrição enteral. De preferência a nutrição enteral deve ser usada em fístulas baixas ou quando é possível passar uma sonda distalmente à fístula. Se o débito estiver mito elevado a nutrição enteral poderá ser contra-indicada.
Que controles deve-se efetuar no acompanhamento das fístulas digestivas?
De maneira geral, este tópico pode ser dividido em:
Diário – Peso corpóreo, débito fistuloso, balanço hidro-eletrolítico, balanço nitrogenado (no início), gasometria, glicemia (NPT)
Semanal – Avaliação nutricional objetiva – antropometria e exames laboratoriais
Eventuais – Ionograma do líquido fistuloso e urinário.
Todos esses dados podem ser modificados e adaptados de acordo com a gravidade do quadro clínico.
Referências:
.Campos & Coelho – Pré, per e pós-operatório. In: Waitzberg DL – Nutrição enteral e parenteral na prática clínica. Ed Atheneu. 1995. pp. 468-72..
Campos e col. – Intravenous fish oil attenuates experimental colites. JPEN. 23:S23, 1999.
Corrêa, CAMF – Pancreatite aguda e crônica. In: Waitzberg DL – Nutrição enteral e parenteral na prática clínica. Ed Atheneu. 1995. pp. 440-45.
Lameu, EB – Doenças inflamatórias do intestino. In. Riela, MC. Suporte nutricional parenteral e enteral.Ed. Guanabara-Koogan. 1993. pp.204-215.
Lisboa e col. – Fístulas digestivas. In: Waitzberg DL – Nutrição enteral e parenteral na prática clínica. Ed Atheneu. 1995. pp. 416.
Morrison & Lark – Medical nutrition and disease. Ed Blackwell Science.368 p. 1996.
Pinto Jr e col. – Moléstia inflamatória intestinal. In: Waitzberg DL – Nutrição enteral e parenteral na prática clínica. Ed Atheneu. 1995. pp. 426-31
Sanderson, IR – Chronic inflammatory bowel disease. Clinics in Gastroenterology. 18:71-87, 1974.
Tremolieres, J – Traitment médical des fistules digestives externes. J. Chir. 5:473, 1965.